Os desafios da comunicação científica


Entendendo que tão importante quanto expor conteúdo é discutir a metafísica do blog dedicarei mais uma postagem a esse assunto.
Provavelmente a mais importante função desses blogs é a popularização da ciência, que é essencial para a democratização do conhecimento e do fortalecimento do verdadeiro poder de decisão da população. Só tem sentido o povo decidir se esse tiver acesso à informação. E por outro lado, a ciência só terá sentido se for intimamente relacionada com a população.
O prof. Eno Picazzio (astrônomo da IAGUSP), em uma matéria na Scientific American Brasil(08/08) que me motivou a escrever este post, escreveu que o desafio da divulgação científica é expor o conhecimento em linguagem popular. E este é um desafio duplo, tanto é necessária a difusão dos conceitos estabelecidos pela ciência, como é essencial que o próprio vocabulário científico seja revisto, para evitar que este seja uma barreira a impedir a difusão do conhecimento, e a afastar a população da ciência. Nesse sentido o professor cita D’Alambert: “nunca seria demais simplificar e, por assim dizer, popularizar a linguagem da ciência, o que seria não só um meio de facilitar seu estudo, como tirar do povo um pretexto para desacreditá-la”. Porém o professor levanta um grande perigo nessa tarefa: a divulgação demasiadamente imprecisa, muito cheia de analogias abusivas pode acabar apenas desinformando.
Quando se trata de um blog de saúde a importância da informação de qualidade é ainda mais marcante. Isso por causa do princípio hipocrático da não maleficência, que significa que antes de ajudarmos devemos ter certeza de que não estamos atrapalhando. Outro princípio muito discutido é o do respeito à autonomia do paciente, e ao seu direito de decidir sobre si mesmo. Para isso é importante que os textos de divulgação científica se prestem não somente a divulgar, mas também a desenvolver no leitor a capacidade de analisar as descobertas, fazendo uma leitura crítica das conclusões tiradas.
Para mim o grande erro que se comete quanto à divulgação científica é exatamente o excesso de conclusões, ou melhor, tratar conclusões como verdades. Isso vai contra o que me parece ser a natureza da ciência, que esta muito mais relacionada com especulações do que com resposta. Não existe uma hipótese na ciência que seja uma verdade imutável. Isso porque a ciência se baseia em modelos, e bons modelos apenas conseguem explicar fenômenos e prever fatos, mas por melhor que sejam nunca serão verdades absolutas. As conclusões científicas são simplesmente a interpretação subjetiva de dados obtidos na experimentação, podem corroborar com a tese criada, mas dificilmente serão a confirmação irrefutável dela.
Para evitar essa lógica, os termos técnicos utilizados devem ser cuidadosamente escolhidos, e extremamente bem explicados. Nessa escolha encontro as maiores dificuldades. Mesmo estando ainda na metade do meu curso de graduação já percebo vários vícios na comunicação, e é comum usar de vocábulos específicos sem a devida explicação. Porém só o cuidado com os termos não basta, é importante a apresentação dos dados, e a discussão deles com objetivo de possibilitar ao leitor tirar suas conclusões, invés de despejar nele nossas próprias certezas.
Esses são alguns dos desafios que percebo, e com a ajuda dos leitores poderemos desenvolver boas soluções, nos aprimorando constantemente nesses assuntos. Sempre que estivermos pecando nesses quesitos, um feedback dos leitores é de grande valia. Que nesse processo possamos ajudar para a chamada popularização da ciência.

6 comentários:

  1. http://www.thatsgoodmedicine.com/

    o último programa desse site trata de racionalismo versus empirismo na história da Medicina. Vale a pena dar uma olhada :)

    os estudos científicos que a gente usa como base para escrever o blog são exemplos da corrente racionalista... Contudo, de nada valem se não puderem ser aplicados na experiência prática, trazendo melhoria na qualidade de vida de população =)

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  2. Sempre querendo ser chato:

    Algumas pessoas ao ler textos assim concluem que, se a medicina é formada por definição de teorias equivocadas, ela não pode ser acreditada. É importante lembrar que TODAS as ciências são assim. Se algum ramo prega que não pode estar equivocado, é porque NÃO é ciência.

    No entanto, apesar de ser um teoria temporária é o melhor que nós temos até o momento. Ou seja, a Teoria da Gravidade de Newton estava errada, mas era um avanço em relação ao pensamento científico da época. A Teoria da gravitação permitiu grandes avanços na matemática e física. Ainda assim estava ERRADA!

    Mas tudo bem, ela serviu a função dela que é melhorar o máximo possível nossa capacidade de interpretar e prever a natureza.

    A medicina também é assim, partimos de teorias e tentamos comprová-las com experimentos. Com isso alcançamos a verdade? Não! Mas é um passo maior em direção a ela.

    Ou seja, se você está com pneumonia e seu médico recomenda que você use antibiótico, ele se baseia em estudos que mostram que o uso de medicamentos levou a cura de 85% dos pacientes em 1 semana.

    Você pode ser um dos 15% que se curou espontaneamente após duas semanas e pode dizer que antibióticos não servem para nada. E realmente não serviu para você.

    Mas tente pensar como o médico. Ele pode escolher um tratamento que tem 85% de eficácia, ou um que tem 5% (cura espontanea em 1 semana). Parece correto escolher o tratamento que permite mais chance de cura.

    Enfim, seu médico nunca vai te oferecer a cura. Mas vai tentar de garantir o melhor do que conhecemos hoje. Infelizmente isso nem sempre é o bastante.

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  3. nossa meu comentário foi quase um post uhauehaueh

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  4. gostei do texto, dusi.
    bora tentar botar num jornalzinho do CA.

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  5. esse conceito de CERTO e ERRADO é muito vestibulesco.
    ehuehuehuehue
    assumir a existência do CERTO presume a existência da VERDADE e acredito que ela não existe (a 'verdade' com V maiúsculo).
    o termo Verdade pressupõe algo absoluto e não acredito que isso exista.
    todas as chamadas 'verdades' são impressões sujeitas è reflexão e transformação e isso as modifica o suficiente para aceitá-las como algo diferente do início.
    a ciência somente se propõe a explicar o processo, e não a chegar ao fim ou à Conclusão.

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  6. Olá, a Roda de Ciência http://rodadeciencia.blogspot.com/
    está discutindo este mês a questão da blogosfera cientifica em portugues, talvez interesse ao leitores deste blog.

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